quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

O Jazz na Música Pessoense

- Artigo de João Cassiano (Chico Correa & Eletronic band / Sanmetak Trio)


Além de ChicoCorrea & Electronic Band, outros grupos formados depois do ano 2000 que merecem destaque num contexto jazzístico são Néctar do Groove (liderada pelo ex-saxofonista de ChicoCorrea), Burro Morto e, mais recentemente, Ubella Preta. Isso demonstra um crescente interesse pela música instrumental, gênero que por si só não possui um público muito grande. Num cenário nacional também se verificava um destaque cada vez maior para a música instrumental: bandas como Hurtmold ou Pata de Elefante conseguiram uma aceitação do público até então inusitada para esse tipo de música. Felipe Gurgel, baixista da banda instrumental cearense O Garfo, em entrevista publicada no blog de crítica musical O inimigo em 2008, afirma:


[...] pelo que recordo, pouco tempo atrás, o Retrofoguetes, por exemplo,
tocou no festival DoSol e no Abril Pro Rock e não era comum bandas
çou a mudar, ao meu ver, quando simplesmente começaram a aparecer outr
instrumentais circulando em festivais independentes. O negócio com
eas boas bandas instrumentais que nunca precisaram programar solos intermináveis para mostrar valor, sobretudo o Macaco Bong e o Fossil.
seja necessariamente complexa. Mas tudo ainda é um processo, apesar d
Com isso, veio a mudança de sensibilidade do público que percebeu que instrumental pode ser rock, pop, ou outra vertente musical que não
esses marcos que eu citei. Já tem gente falando que instrumental é a “bola da
download livres, fez com que tivéssemos acesso a coisas difíceis de enc
vez” na cena indie, discordo totalmente. Me aponta uma banda ruim, dessa vertente, que esteja circulando regularmente em festivais. Esse termo “bola da vez”, francamente, às vezes é desabafo de quem tem preguiça de correr atrás. (GURGEL, 2008).10 Apesar disso, é inegável que tenha havido tanto um aumento da quantidade de bandas quanto um aumento do público. Thiago Sombra, baixista que já tocou em várias bandas de João Pessoa, e que atualmente toca na ChicoCorrea & Electronic Band, destaca um aspecto que pode explicar esse recente interesse em música instrumental, que também pode explicar esse grande número de influências tão diversas na música dos últimos anos: “a internet, com os blogs d
eontrar no formato CD”, e acrescenta: “a efervescência do afrobeat provavelmente contribuiu para a identificação da já riquíssima música paraibana”.

Em seu livro História Social do Jazz, escrito entre 1959 e 1961 (e reeditado em 1989 na Inglaterra), o historiador britânico Eric Hobsbawm, que também trabalhou como crítico de jazz da revista inglesa New Statesman, afirma sobre o jazz que “a história de sua evolução e transformação [...] permanece um assunto americano” (HOBSBAWM, 2009, p.101). Entretanto, em sua introdução para a edição de 1989, trinta anos depois, falando dos subseqüentes desenvolvimentos do jazz, ele diz:
O afrouxamento da estrutura tradicional do jazz, seu movimento cada vez mais voltado para algo parecido com a música clássica avant-garde o expuseram a todos os tipos de influência não jazzística vindos da Europa, da África, do mundo islâmico, da América Latina e, principalmente, da Índia. [...] Em outras palavras, se tornou menos americano do que antes. (HOBSBAWM, 2009, p. 20).
s africanas desaparecidas, a uma cultura e uma arte mais internacionais, que falam a todas as civilizações (africanas, asiáticas, indianas) que sofrem o imperialismo ocidental. Nessa nova fase, a produção musical propriamente dita se abre a correntes e influências múlti
Esse pensamento é complementado (entrecortado por observações de cunho político, que têm sua relevância no contexto da época, porém pouca ou nenhuma no contexto do jazz pessoense abordado aqui) por Philippe Carles e Jean-Louis Comolli em seu livro Free Jazz Black Power: Se havia passado da afirmação de uma cultura e de uma arte autenticamente negra e referente apenas a civilizaçõ
eplas e extra-africanas11, às quais a música afro-americana [...] não teme mais se aliar. (CARLES; COMOLLI, 1973, p. 32). Isso demonstra a que estágio chegou a versatilidade do jazz ao longo do século XX e o número de influências que ele incorporou. Ao chegar a João Pessoa, o jazz aglutinou elementos da música popular local com a mesma facilidade. Isto é evidente em bandas como Néctar do Groove: a um sax fortemente influenciado pelo afrobeat e por essa vertente mais cosmopolita do jazz, soma-se uma viola caipira e percussões influenciadas por ritmos locais. Atualmente, pode-se dizer que o inverso também ocorre e que o jazz tem influenciado

diversos outros tipos de música. João Cassiano, percussionista da ChicoCorrea & Electronic Band, afirma:
[...] Acho sim que o jazz influencia na música pessoense, direta e indiretamente.
Indiretamente pela influência que estilo exerceu em outros estilos musicais como bossa nova, o acid rock, o rock progressivo dos anos 60/70 e o rap. Muitas vezes bebemos da fonte do jazz sem saber. (CASSIANO,2010).
Essa influência tão variada é facilmente percebida. Um evento relativamente recente,
e desde 2008. O evento consiste exclusivamente em música instrumental: as bandas e músicos que já passaram pelo palco são: Cabeça de Galo, Burro Morto, Néctar do Groove, Aerotrio e o DJ Naza.12 Um espectador que estivesse familiarizado com formas e compositores mais “clássicos” de jazz (desde o mais tradicional Duke Ellington até o mais experimental (Herbie Hancock) poderia ter dificuldades em classificar a música desse festival como jazz,partindo destes parâmetros, pois o jazz foi diluído a ponto de se tornar irreconhecível. Porém, ele está lá, do mesmo jeito que as melodias de cantochão se escondiam nos mot
porém significativo no cenário jazz pessoense é o Natal com Jazz, que ocorre anualmen
tetes de compositores mais tardios até ficarem irreconhecíveis, mas sua função e intenção continuavam lá. Outro evento importante para o cenário jazz foi o agora abandonado Ciclo das Quartas, idealizado por Esmeraldo. O projeto tinha como objetivo oferecer, todas ou quase todas as quartas-feiras um espaço para livre improvisação e experimentação, com “pocket shows com convidados, jam sessions e DJ sets temáticos.”13 O projeto chegou a ter cinco edições, entre 7 de julho e 8 de setembro de 2010. Trouxe à cidade músicos como Haley Kallenberg,pianista de jazz do Alaska radicada em Dubai, Gregg Mervine, baterista de jazz da Philadelphia, atualmente habitando em Monteiro, e juntou no mesmo palco músicos como Didier Guigue, DJ Guirraiz e o paraibano radicado em Minas Gerais Babilak Bah. Outros músicos que passaram pelo palco incluem Thiago Sombra, João Cassiano, Ubella Preta, Haley Arthur (membro de Burro Morto), Stephan Buhler (ex-membro de ChicoCorrea & Electronic Band e membro de Néctar do Groove), Victor Ramalho (baterista, entre outros, de ChicoCorrea & Electronic Band e Seu Perereira & Coletivo 401), Gustavo Miranda, Totonho e outros. Embora tenham sido poucas edições, o cenário de jazz ganhou relativa visibilidade.
Como conseqüência, na edição de 2010 do Festival Mundo houve uma apresentação do Parahyba Art Ensemble, que consistiu em Esmeraldo e convidados, entre os quais Didier Guigue, DJ Guirraiz e Gregg Mervine, que já haviam passado pelos palcos do Ciclo das Quartas.

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